quinta-feira, 22 de setembro de 2011

DEVAGAR...

Mal comecei o blog, estou meio devagar. Devagar para correr, devagar para divagar. Aliás, apesar do título ser sugestivo, neste blog não pretendo falar só de corrida. Afinal, eu não corro tanto assim. Divago muito mais.
Tem dias em que a correria é tanta, que não consigo correr, nem divagar (nem comer, nem dormir, nem fazer xixi). Mas nem tem sido tanta correria assim... Estou devagar mesmo.



quarta-feira, 14 de setembro de 2011

AS DUAS TRIBOS DE RUA – Divagações durante a Corrida do Centro Histórico

Como adoro correr e divagar, nada melhor que inaugurar este blog escrevendo sobre uma corrida que corri devagar e sempre, divagando sempre. Foi a 16a Corrida do Centro Histórico, organizada pela Corpore (07/08/2011). Esta é uma das corridas mais charmosas de S. Paulo, por percorrer o velho centrão, dando oportunidade (se sobrar fôlego) de curtir os clássicos cartões postais – Viaduto do Chá, Teatro Municipal, Av. S. João, Viaduto Sta. Ifigênia, Pátio do Colégio, Praça da Sé...,  para citar alguns.
Graças a essa peculiaridade geográfica, existe também uma boa chance de perceber o contraste entre duas grandes tribos de rua – os moradores e os corredores. Ambos, diga-se de passagem, em número crescente a cada ano.
Enquanto a maioria dos moradores, por falta de opção, ainda se mantinha no (des?)conforto de todas as cobertas possíveis, os corredores tinham optado por levantar muito cedo e sair de casa com pouca roupa. Alguns moradores já acordados permaneciam sentados semi enrolados em seus trapos, observando desfocadamente os milhares de pares de joelhos, pernas e tênis que, em diferentes velocidades, cruzavam seu campo de visão. Onde fica a ouvidoria para se reclamar contra esses invasores que perturbam a paz da manhã quase fria de um belo domingo?
A cena mais bonita estava ali por volta do km 5. Daquelas, de quase fazer inveja, ou no mínimo te deixar pensando... Em primeiro plano: uma larga calçada atapetada de ipê roxo. Um luxuoso tapete de flores mortas, de um pink muito vivo (porque o ipê roxo não é roxo, certo?). Segundo plano, onde a calçada encontra a muretinha do jardim: um cobertor de cor indefinível formando um “charuto” estendido sobre o tapete pink – imaginei haver no mínimo um ser humano ali dentro; com sorte, um ser humano e outro canino. Próximo dele, a árvore de ipê roxo, com as flores pink – a metade que ainda não caiu. Terceiro plano, lá no fundo, visível por entre as flores pink do ipê roxo: a Catedral da Sé, secular e majestosa, iluminada pelo sol do amanhecer, aquele que promete um dia quente e lindo.
Quarto e último plano, o meu plano mental: não seria lindo, aliás, acordar todos os dias num lugar desses, lá pelas 11 da manhã, sem despertador – e sem a menor noção do odiável modo snooze -, com o sol batendo na cara, no ipê, na catedral? E eu, que já suo a camisa durante a semana toda, aqui, suando de novo em pleno domingo, 8 e pouco da manhã (pode-se dizer madrugada, vai...), ofegante, correndo feito louca, em nome da saúde, da satisfação pessoal, da superação, ou qualquer outro motivo mais nobre que não me ocorre no momento...
Por outro lado, vejamos: eu já lavei o rosto, escovei os dentes, tomei um baita café da manhã, fui ao banheiro... tudo sem tapete pink nem catedral nem sol na cara. E sem a menor consciência de quão feliz eu sou por poder fazer tudo isso todos os dias sem a menor consciência. Para o indivíduo enroladinho no cobertor sobre o suntuoso tapete pink – e para todos os colegas da mesma tribo, deve ser muito suado fazer metade disso, dia após dia.
Faltavam mais quatro quilômetros. Continuei, esbaforida, suando a minha linda camiseta preta de manga longa, convencida de que sou muito mais feliz por pertencer a esta tribo e não àquela.